Muito tem se falado sobre uma possível crise econômica global que se aproxima a passos largos. Se olharmos a natureza cíclica da economia global, marcada por ciclos de expansão fomentada por políticas expansionistas de crédito que geram liquidez artificial e ciclos de contração que corrigem as distorções geradas durante o período de boom, parece ser claro que uma nova crise deve acontecer em breve, especialmente quando se considera que a última grade crise – a de 2008 – já se passou há mais de 10 anos.
Una-se a isso o fator pandemia, que adiciona ainda mais incerteza e imprevisibilidade para o futuro econômico próximo, e não há como não ficar alerta a possibilidade de uma nova crise global que potencialmente pode ter proporções muito maiores do que a última grande crise ou mesmo do que a crise de 1929.
Mas o quão próxima esta crise está? E quais são os fatores que podem ser observados que nos indicam que ela já começa a se desenvolver? É sobre isso que iremos falar melhor nesse artigo.
O Presságio da próxima Crise
O primeiro fator que liga o alerta para a próxima crise global é o próprio funcionamento da economia em nível mundial. A forte intervenção governamental no controle da taxa de juros e da reserva monetária leva, necessariamente, a uma economia cíclica, que terá períodos de marcado crescimento econômico acelerado e outros de forte queda na demanda geral e consequente contração.
Isso ocorre porque, ao tentar estimular o consumo através da diminuição da taxa de juros, o governo gera uma expansão descontrolada do crédito, que por sua vez gera uma liquidez artificial, ou seja, os consumidores possuem mais dinheiro para gastar, e durante algum tempo a economia crescerá de modo acelerado a medida em que o consumo se expande continuamente com base no crédito abundante. Em algum momento, entretanto, esse dinheiro terá de ser devolvido e com juros. Alguns consumidores não conseguirão quitar suas dívidas e a taxa de juros subirá novamente, gerando uma contração repentina no consumo.
Ao mesmo tempo, no nível empresarial, a abundância de crédito leva ao menor critério do empresário médio na abertura de negócios sem fundamentos tão bons e que não podem se sustentar a longo prazo, mas que, na febre gerada pela liquidez artificial, parecem ser negócios fantásticos e com alto potencial, os chamados malinvestments por Mises, o fundador da escola austríaca de economia.
Essa natureza cíclica de uma economia com forte intervenção de um Banco Central nos permite afirmar que a um período de bom crescimento econômico sempre se sucederá um de marcada contração da economia. Mas a partir de quando exatamente podemos dizer que o ciclo se inverte?
Bom, para isso temos algumas pistas que podem ser utilizadas. Historicamente, os EUA têm apresentado uma crise econômica a cada 8 ou 9 anos desde a Segunda guerra mundial, variando entre crises menos graves e crises avassaladoras. Entretanto, estamos já em 2021, 13 anos depois da última grande crise global de 2008, iniciada pela expansão do crédito imobiliário subprime americano e os EUA continuavam em uma fase de crescimento econômico até a pandemia. Muitos podem imaginar que a crise econômica gerada pelo patógeno já é a crise que se esperava, mas a realidade é que, pelo menos no momento atual, ainda é possível disfarçar grande parte dos efeitos da crise por meio da injeção maciça de liquidez na economia através da impressão descontrolada de dinheiro, coisa que todos os países do mundo fizeram no ano passado e nesse ano, especialmente o FED. Do total de dólares em existência no mundo, 35% foi impresso apenas no ano passado.
Mas é claro que, em algum momento, a conta chega. E a impressão descontrolada da moeda só serviu para, a longo prazo, criar uma bolha ainda maior que, ao ser estourada, irá causar efeitos ainda mais devastadores. Não é por outro motivo que muitos economistas vem chamando a próxima grande crise de a “mãe de todas as bolhas”.
Uma observação importante de ser feita é que os ciclos econômicos de crescimento/recessão têm mudado de configuração ao longo das últimas décadas. Em geral, os ciclos de crescimento têm se tornado mais longos –porém com um crescimento médio anual menor – e os de recessão mais curtos. Essa nova configuração é vista como um sinal de progresso pelo Banco Central americano, o FED, mas na realidade apenas prepara o cenário para uma crise ainda mais catastrófica no futuro.
De fato, Alan Greenspan, que foi presidente do FED de 1987 até 2006 – pouco antes do estouro da crise econômica – chegou a afirmar que o conhecimento obtido nas gerações anteriores permitiria ao FED chegar perto de eliminar as crises econômicas através de constante reinjeção de liquidez na economia.
A realidade, entretanto, é que as crises cíclicas surgem exatamente em decorrência da liquidez artificial injetada na economia pelas políticas de expansão creditícia do Banco central, sendo um mecanismo do mercado para corrigir os péssimos investimentos feitos durante esse período de falsa bonança, bem como o endividamento em excesso e a falsa prosperidade de negócios que, sem aquela liquidez artificial, jamais prosperariam
A crise nesse caso é, portanto, fundamental para que o mercado volte a operar da maneira adequada e a economia possa crescer de modo real. Ao injetar liquidez com ainda mais agressividade na economia, ao longo de um tempo maior, como parece ser a ótica do FED, que vem sendo aplicada com ainda mais intensidade em 2021 com o anúncios dos pacotes trilionários de estímulo a economia, o que teremos é um período de correção ainda mais violento nos esperando logo a frente.
A inversão da curva da Taxa de juros
Como você já sabe, a tendência natural no mercado de títulos de dívida é que os títulos de curto prazo, que pagam ao credor em um período de meses ou poucos anos, oferecem uma taxa de juros menor do que os títulos de longo prazo, a serem pagos em 5, 10 anos ou até mais em muitos casos.
Essa tendência decorre da própria lógica, já que o credor que abre mão do seu capital principal durante uma maior fatia de tempo necessariamente desejará ser melhor remunerado por isso, de modo que títulos que vençam em um prazo mais longo terão de oferecer juros maiores para os seus detentores.
Entretanto, algo que vem se observando nos últimos tempos é a inversão da curva de juros, algo que historicamente tem antecipado as crises econômicas americanas e, indiretamente, do resto do mundo. O spread, ou a diferença, entre os juros dos títulos do tesouro americano de 10 anos e os títulos de 3 meses tem se chegado próximo a zero, ou seja, alguém que abre mão de seu dinheiro por 10 anos irá ganhar, em juros anuais, quase o mesmo que alguém que abre mão do dinheiro por apenas 3 meses, o que representa uma distorção do mercado de títulos americanos.
A inversão da curva de juros dos títulos americanos é um sintoma da deterioração da liquidez e a futura necessidade de refinanciamento de dívidas provocada pelo ciclo de expansão anterior, e, por isso, quase sempre ao longo da historia previu a ocorrência de uma crise de alguns meses até 2 anos depois de verificada.
Em alguns casos, o spread entre um título de longo prazo e um de curto prazo se encontra negativo, como é o caso das notas do tesouro americano o que denota ainda mais a queda brusca na liquidez desde o último ciclo expansionista, iniciado em 2009.
Crise mundial econômica em 2021 ou 2022? Como se proteger da próxima grande crise?
Com a junção dos dois fatores discutidos acima, torna-se quase inevitável a ocorrência de uma crise global em breve, e provavelmente será uma ainda pior do que a de 2008, dado que as causa de qualquer crise econômica – expansão artificial da liquidez impulsionada pelo banco central – estão se verificando em ainda maior intensidade. Mas como é possível se proteger contra essa crise?
Bom, a primeira questão aqui é se lembrar de que toda crise traz em si também uma grande oportunidade, pois muitos dos ativos de alta qualidade e caros demais durante o momento de boom se tornam suficientemente baratos para que possam ser comprados em grande quantidade por investidores perspicazes.
De fato, muitos investidores enriqueceram em momentos de crises. John Templeton, sobre o qual já falamos aqui, saiu de uma infância pobre para se tornar um bilionário em grande parte devido a ter sabido aproveitar o momento econômico da segunda guerra mundial, na qual grande parte dos investidores ficou com medo e parou de aplicar dinheiro no mercado, barateando em larga escala ações de empresas com excelentes fundamentos.
Para usar um exemplo mais atual, o maior investidor do mundo Warren Buffet esta atualmente em uma posição extremamente líquida. O fundo da Berkshire Hattaway atualmente possui 140 bilhões de dólares – de um total de 200 bilhões – em dinheiro. Buffet parece estar se preparando para as compras à espera da próxima crise.
Portanto, a primeira forma de se preparar para a próxima crise é manter um mínimo de liquidez, dinheiro em caixa para investir quando os ativos caírem vertiginosamente de preço na próxima crise.
Um segundo método é investir em ouro físico. O ouro, apesar de muitas mudanças ocorridas no cenário econômico global ao longo das últimas décadas, continua sendo uma reserva de liquidez, pois é extremamente difícil de ser depreciado já que o aumento na oferta de ouro, em termos de sua produção anual, representa apenas uma pequena parcela do ouro total em circulação no mundo, tendo em vista que devido a sua propriedade de indestrutibilidade, o ouro em circulação em tempos atuais é a soma de todo o ouro já minerado pela humanidade desde vários milênios atrás. Isso faz do ouro um ativo extremamente robusto, cuja oferta, diferentemente da oferta de moedas fiat, emitidas pelo governo, não pode ser inflada de uma hora para outra.
Por fim, uma opção também seria ter pelo menos uma parte do seu capital em Bitcoin, o ouro digital. Embora muitos digam que o bitcoin possa estar em uma bolha devido a rápida valorização apresentada nesses primeiros meses do ano de 2021 o fato é que, ainda que isso possa ser verdade a curto prazo, o Bitcoin possui fundamento de longo prazo que o tornam um ativo eminentemente diferente de moedas emitidas por governos. Sua oferta é totalmente previsível, a uma taxa atual de 6,25 bitcoins por bloco, ou 900 bitcoins/dia. Além disso, há um limite máximo programado de 21 milhões de bitcoins (atualmente são cerca de 19 milhões de bitcoins em existência), momento em que nenhum bitcoin será emitido mais. Portanto, faz mais sentido ter pelo menos uma parcela do seu capital guardado em bitcoin do que deixar tudo em moedas totalmente controladas por governos, que já foram inflacionadas de modo sem precedentes no ano passado e que continuarão sendo a medida em que os governos ficarem cada vez mais desesperados tentando conter a inevitável crise.
Além disso, não se pode esquecer que a história do bitcoin esta estreitamente ligada a rejeição desse sistema financeiro atual. O próprio Satoshi Nakamoto, criador do bitcoin, deixou uma referência no bloco gênesis, o primeiro bloco da rede do bitcoin, a uma notícia do the Times que informava que mais um resgate bilionário aos bancos estava prestes a ser aprovado após a crise de 2008. Esse fato nos mostra que o bitcoin foi criado exatamente para ser uma alternativa ao sistema monetário e financeiro atual e a todas as suas mazelas, incluindo a destruição do poder de compra da moeda e empobrecimento geral da população comum enquanto alguns poucos lucram muito, quebram a economia e depois ainda são livrados de enfrentar as consequências pelo estado, utilizando dinheiro da população.
Apesar de todos efeitos devastadores que uma crise é capaz de causar, pelo menos um efeito positivo dessa próxima crise pode ser o de que, mesmo o cidadão comum, leigo, perceba que não há mais como conviver com o sistema atual de controle do dinheiro centralizado nas mãos de estados e instituições gigantescas, que se ajudam mutuamente enquanto ele apenas arca com os custos e o sofrimento. Talvez aí então comece, verdadeiramente, a era do Bitcoin e das criptomoedas.